1 de maio de 2007

Enélio Petrovich: O guardião da memória norte-rio-grandense

Foto: AG Sued
Enélio Lima Petrovich está na presidência do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN) há 38 anos, aonde desenvolve um inigualável trabalho em favor da cultura do RN. Ex-secretário de Estado, publicista, advogado, historiador, escritor, jornalista, imortal da Academia Norte-riograndense de Letras, e acima de tudo, discípulo de Câmara Cascudo, Enélio Petrovich tem como missão de vida zelar pela memória potiguar.

por Alexandro Gurgel

O senhor está há 38 anos a frente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e foi eleito novamente para o biênio 2007-2009, prestes a ficar 40 anos no cargo. Para o senhor, o que represente esse tempo todo na administração de umas das mais importantes instituições para o Estado?
Esse período como presidente do IHGRN é um tempo gratificante. A presidência é uma função sem remuneração e sua finalidade é preservar o patrimônio do Rio Grande do Norte. O cargo é gratificante e aceitei de bom grado. É quase uma homenagem ao meu tio-avô, Nestor Lima, a quem eu devo minha formação cultural. Eu só perco, em tempo de direção, para duas pessoas: Dona Noilde Ramalho que tem mais de 60 anos como diretora da Escola Doméstica de Natal e para Fidel Castro, que é ditador desde 1958.

Em meio ao grande acervo do IHGRN, quais as peças mais importantes para a História e a Geografia do RN?
Aqui, temos o maior acervo de documentos do Estado entre livros, periódicos, revistas, etc. É difícil citar. Mas, posso dizer que temos a estola de Padre Miguelinho, o primeiro telefone de Natal, temos o Barleus, um livro precioso que marca os oito anos da presença holandesa no Nordeste Brasileiro com Mauricio de Nassau. Esse livro é escrito em latim, tem ilustrações de Franz Post e é raríssimo porque só existem três exemplares no Brasil. Um livro datado de 1647. Temos ainda a primeira pia batismal, o primeiro cofre do município, a mesa de Pedro Velho, etc. Temos uma vasta documentação sobre o Estado do Rio Grande do Norte na parte geográfica e histórica. Além de tudo isso, temos um acervo de livros fabuloso. Várias bibliotecas de importantes intelectuais e ex-governadores que doaram ao IHGRN.

O IHGRN também guarda o bilhete escrito pelo cangaceiro Lampião, em 1927, e enviado ao então prefeito mossoroense Rodolfo Fernandes, pedindo um resgate para não invadir a cidade. Na véspera da comemoração dos 80 anos da Resistência, os mossoroenses estão solicitando que esse documento volte para a cidade. O IHGRN vai devolver o bilhete?
Há um mês, recebi uma comissão lá de Mossoró para conversar a respeito desse bilhete e eu prometi entregar. Desde que assumi a presidência do IHGRN nunca vi esse bilhete. Estamos procurando com muito cuidado, muita perseverança, mas até agora, não o encontramos. Eu disse que esse bilhete, a princípio, deve ter sido entregue ao Instituto na gestão de doutor Aldo Fernandes Raposo de Melo, através de Raul Fernandes. De 1963 pra cá, não consta nada a respeito do bilhete. Estamos procurando e se for localizado, entregarei com muito prazer.

De que maneira o IHGRN vai homenagear o centenário de nascimento do escritor e folclorista Raimundo Nonato da Silva?
Estou providenciando o centenário dele para agosto, o mês que ele nasceu. Nós vamos fazer uma solenidade em Martins, onde Raimundo Nonato nasceu, e outra aqui no IHGRN. Ele era uma figura humana excepcional, uma grande pessoa que dedicou sua vida inteira a pesquisa, a literatura, ao patrimônio histórico, as tradições potiguares, etc. É um homem que deve ser homenageado no seu centenário de nascimento.

Como o senhor absorve os mega-eventos que visam preservar a história e a cultura do Rio Grande do Norte?
São válidos. Tudo que for feito para a preservação da memória merece o apoio e que seja acatado por todos nós que estamos dentro deste contexto cultural.

Como o senhor se sente fazendo parte da Academia Norte-riograndense de Letras?
Eu digo muito em tom de blague que nos somos “imortais morríveis”. Entrei na ANL na cadeira de Virgílio Trindade, na cadeira número 4 que pertenceu a Lourival Açucena e fui saudado pelo grande Mestre Câmara Cascudo, numa solenidade muito bonita. É um galardão que muito me orgulha e tenho colaborado para que a Academia seja um veículo de comunicação na Literatura do Rio Grande do Norte.

O senhor não acha que é muito tímido o número de intelectuais mossoroenses na ANL?
Há valorosos estudiosos da nossa história que são mossoroenses e que dedicam suas vidas ao instrumento da nossa cultura. Há algumas vagas abertas na Academia e quem desejar se escrever não há problema. Mas, a ANL está contemplada com vários mossoroenses como João Batista Cascudo Rodrigues, Elder Heronildes da Silva, o saudoso Vingt-Un Rosado - uma figura humana fabulosa, que me deixa muita saudade quando lembro dele. Portanto, a Academia está de portas abertas para quem quiser ser “imortal morrível”.

O senhor teve um relacionamento muito próximo com Câmara Cascudo. Em poucas palavras, como o senhor definiria o Mestre?
Cascudo foi um gênio. É um único gênio do Rio Grande do Norte. Eu digo muito que não foi a guerra que projetou Natal, foi Cascudo. Eu tive muito contato com ele, tanto aqui no IHGRN quanto na sua residência. Ele sempre foi uma bússola através da qual eu fiz minha trajetória cultural. Quando conheci Cascudo eu ainda era garoto. Minha mãe era prima de dona Dáhlia. Minha aproximação com ele cresceu mais quando assumi a presidência do Instituto e com Cascudo mantive uma relação social e cultural muito intensa. É muito difícil fazer uma definição de Cascudo em poucas palavras. Mas, ele foi o samaritano da cultura norte-riograndense. Cascudo foi um grande homem. Da sua boca nunca saía palavras de mágoas e ele dizia sempre: “nunca some os desenganos”. E eu tenho essa frase escrita na minha mesa. Para mim, Câmara Cascudo é um guia permanente.

O que é necessário para ser sócio do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte?
Juntar o currículo, umas obras publicadas no campo da pesquisa, sobretudo em Geografia e História (regional ou nacional) e encaminha a presidência. Nós temos uma comissão de sindicância que aprecia os trâmites e decide se é sócio efetivo (morando em Natal) ou correspondente (quando mora fora de Natal). Ainda temos sócio benemérito e sócio honorário. Depois que a comissão dá um parecer favorável, a documentação vai a plenário e se aprova o novo sócio.

Um comentário:

Moacy Cirne disse...

Meu caro Alex: No Balaio de ontem, Maria Bunita, em seu Diarim, voltou a fazer referência ao Beco e, explicitamente, a um tal Alequici, que, acedito, deva ser você. Enquanto isso, gostei de sua entrevista com o Dr. Enélio. Ah, sim, quando surgiu mesmo a revista Papangu? Um abraço.