Por Leonardo Sodré
Era um sábado chato, cheio de chuvas. Da janela do apartamento o visual contrastava entre o cinza provocado pelas nuvens e o verde molhado e alegre dos morros do Parque das Dunas. Quase nada para fazer. Os filmes que passavam nos vários canais da TV a Cabo eram chatos, outros repetitivos. Voltar a pintar o painel que eu estava produzindo desde o começo da manhã era impraticável. Estava sem saco, sem inspiração e sem paciência para focar os pequenos detalhes. Não tinha o que fazer. Até que o telefone tocou. Era o escritor e fotógrafo Hugo Macedo:
-Leo, você passou aqui por perto do Bar de Nazaré?
-Passei. Saí para comprar cigarros e não parei porque não vi ninguém conhecido...
-Homem! Venha para cá. Estou sozinho na maior luta para terminar uma garrafa de cerveja bem geladinha...
O convite certo. No sábado certo e na hora certa.
Em poucos minutos estávamos discutindo os problemas brasileiros, falando da possível derrota do América – isso porque Paulinho de Nazaré sentou-se na mesa vestido de abecedista para agourar o Mecão -, que terminou perdendo no outro dia.
Amigos chegavam e saiam, até que no finzinho da tarde a garçonete Tázia, olhos brilhantes por causa dos galanteios do dono da “Capitão Gancho Produções Artísticas”, anunciou sorridente, solene e aliviada, como se estivesse em um fino restaurante, daqueles que aparecem na revista Deguste:
-A “chef” Nazaré mandou anunciar que a cozinha está fechada.
Foi o mote para nos mudarmos para o Bardalos. Aliás, o Bardalos é o destino oficial de todo mundo quando nos fins de tarde de sábado os bares das proximidades do Beco da Lama começam a fechar. Ricardo, o garçom, de mau-humor ou não, nunca fecha cedo e os papos se prolongam. Aliás, agora ficou mais difícil chegar em casa, porque Pedro Abech também resolveu abrir um bar que não tem hora para fechar.
Hugo já estava meio “triscado” – havia misturado a cerveja com algumas lapadas de cana -, quando começamos um papo sobre cinema numa mesa de fundo com o cineasta Carlos Tourinho. Papo bom, cheio de revelações, até que chega a mesa um amigo de Hugo, com sotaque francês e pergunta:
-Hugo, quem ganhou o MPBeco?
Hugo olhou para mim com aquele olhar de quem está vendo dois. Depois olhou para Carlos Tourinho e por fim para o teto. Pensou um pouco, alisou a barba, tomou um gole de cerveja de supetão e estirou a palma da mão esquerda como se estivesse segurando uma bandeja. Com a direita iniciou um movimento de corte, como se partisse um pão e disse rápido, muito rápido, olhando bem dentro dos olhos do amigo:
-Dunga ficou em terceiro lugar!
-Mas Hugo – retrucou o francês – eu quero saber quem ganhou...
-E eu sei?
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