10 de março de 2008

O Sêbado e a confraria daquele sábado

O dono do Sêbado, Marcos Almeida e o presidente da "Confraria do Sêbado, Geraldo Maia.
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Texto e Foto: ALEXANDRO GURGEL
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Quando teve início a propagação da Internet, várias profecias vaticinavam que o livro, em seu formato tradicional, estava com os dias contados e acabaria por desaparecer num futuro não muito distante. A freqüência com que surgiam essas conjecturas deixou os amantes do livro preocupados. Mas, foi uma inquietação inútil porque até agora aquelas profecias não se realizaram e os fatos parecem indicar que estavam equivocadas.

Nunca foram publicados tantos livros sobre os mais variados assuntos como nos dias de hoje. O consumo literário também cresceu de forma considerável. Além das tradicionais livrarias, os sebos vêm conquistando espaço entre os leitores mais exigentes, aqueles que buscam obras raras e esgotadas, que só encontram em lugares especiais. Na verdade, um sebo é um tipo de limbo, onde almas de escritores estão aguardando por alguma salvação e outras amargam o espaço na prateleira da danação eterna.

As enciclopédias da vida ensinam que a origem do termo sebo, para designar livrarias de livros usados, tem explicação histórica. A teoria mais provável conta que, antes do surgimento da luz elétrica, as pessoas liam sob a luz de lamparina. Uma espécie de resíduo gorduroso era produzido e se fixava nas capas dos livros. A vida de um sebo é feita de letras miúdas e gente vultosa. E o tempo conserva a vitalidade desse espaço tão procurado por intelectuais, artistas, estudantes, professores, músicos, curiosos e outros literatos.

Porém, nem só de literatura vivem os sebos. Nas manhãs de sábado em Mossoró, o dentista Marcos Almeida abre as portas do “Sêbado” - uma corruptela para sebo aos sábados - a fim de receber os amigos e clientes em volta de uma grande mesa, onde acontece declamação de poesia, uma roda de samba e muita conversa sem fim. Tudo regado a uma boa maxixada (especialidade do anfitrião), acompanhada de cervejas geladas e muito burburinho.

O Sêbado é a realização de um sonho de Marcos Almeira, que montou um espaço na sua própria casa para abrigar o sebo, na Rua Antônio Vieira de Sá, bairro Nova Betânia. “Esse lugar foi feito para que as pessoas se sintam como se estivessem nas suas próprias casas e onde abrigasse aqueles imbuídos em promover os movimentos culturais da cidade”, afirmou Marcos Almeida, lembrando que também há um interesse financeiro com a troca e venda de livro e discos usados, tradicional comercio de sebo.

Longe dos afazeres alfarrabistas, Marcos Almeida é cirurgião dentista há 27 anos. Durante a semana, atende seus clientes em um consultório na clínica da doutora Graça Lopes. “Por causa da minha atividade profissional, só abrimos aos sábados”, ratificou o nome do estabelecimento. A paixão pelos livros começou quando Marcos morava em Natal onde era freqüentador assíduo do Sebo do Cazuza, um dos mais antigos sebistas do Rio Grande do Norte. “Cazuza norteou o destino de muita gente vendendo seus livros pelo peso”, assegurou.

O Sêbado daquele primeiro sábado começou com o acervo particular e a coragem de Marcos Almeida na efetivação de um sonho, onde livros, CDs, DVDs e vinis ostentam uma inegável atmosfera de informalidade, que convida ao diletantismo e ao relaxamento. Marcos ressalta a importância do intercâmbio com outros sebistas e confessa que seu livro de cabeceira é “Guia de Sebos de Natal”, publicado pela Editora Sebo Vermelho, do irrequieto sebista e editor natalense, Abimael Silva. “Admiro o trabalho feito pelo Abimael. Inclusive, há algumas obras da Editora Sebo Vermelho no Sêbado. Sempre que vou à Natal, procuro visitar todos os sebos de lá”, disse.

Marcos Almeida garante que no acervo do Sêbado há verdadeiras raridades, mas o proprietário faz uma ressalva de que “o livro mais importante é aquele que o cliente procura”. Entre as raridades do sebo, o freguês mais exigente pode encontrar a edição original do livro “Momento do Rio Grande do Norte - de 1597 a 1939”, de Câmara Cascudo. “Essa é a 1ª edição e não tenho conhecimento se o livro foi reeditado. Entre outros livros de Cascudo que temos, esse é um livro mais importante”, distingue Marcos, destacando que há ainda livros como coleção completa de Gilberto Freire e uma edição de luxo da obra “A Pedra do Reino”, de Ariano Suassuna.

Alheio as profecias prenunciando o fim do livro, Marcos Almeida convida as pessoas para uma aventura ao Sêbado para ouvir música, experimentar a maxixada, trocar idéias e se sentir cercado por um pedaço da memória escrita, por livros de ontem e de hoje, que cumpriram uma longa trajetória desde que saíram da gráfica até encontrarem um abrigo naquele espaço democrático. No Sêbado, é como se cada livro, revista, enciclopédia, almanaque, tivesse uma história diferente para contar.

Congregação cultural do Sêbado

O Sêbado tem vida própria. Entre suas estantes abarrotadas de obras contendo toda a memória de décadas de produção literária, seus freqüentadores criaram a “Confraria do Sêbado”, cujo estatuto foi redigido em cordel pelo poeta Nilson Silva. “No sábado de manhã, não há outro programa cultural melhor em Mossoró do que vir para a Confraria do Sébado ver bons livros, discos e apreciar uma boa música. Nosso microfone está sempre aberto para quem quer dizer algo, cantar ou declamar um poema”, ressaltou o historiador Geraldo Maia, presidente da Confraria.

Porque hoje é sábado (como diria Vinícius de Morais), é preciso conciliar o dia para reunir poetas, jornalistas, advogados, escritores, artistas, médicos, papangus e toda a fina flor da intelectualidade mossoroense num ideal de cultura para a cidade. Conforme o presidente, um dos principais objetivos da Confraria do Sêbado é fomentar a cultura mossoroense da melhor maneira possível, estimulando as produções artísticas, os lançamentos de livros, as exibições de arte e todas as formas de cultura popular.

Recentemente, dois livros foram lançados pelos confreiros no espaço do Sêbado. O poeta Luiz Campos lançou a obra “Nos campos da poesia” e o escritor Zé Gurgel lançou seu livro de crônica “A Ponte”. “Venho aqui pelo ambiente e pelo dono. Sinto-me bem recitando uns versos para os amigos e tenho oportunidade de conhecer outros poetas”, disse o velho bardo Luiz Campos, ressaltando que poetas e artistas de outras cidades quando vêm à Mossoró são convidados a sentir a atmosfera do lugar.

Os freqüentadores da Confraria do Sêbado têm sempre uma boa história para contar enquanto entoam versos ou se esbaldam em música, momentos de total abstração da correria das ruas, numa construtiva troca de idéias com outros confrades. Isso, sem contar, o enorme prazer que é estar rodeado de livros, num ambiente despojado e acolhedor. Para o jornalista Ferreira, da Gazeta do Oeste, a Confraria do Sêbado vai se tornar o lugar para grandes encontros da cultura mossoroense. “Quando cheguei aqui pela primeira vez, encontrei logo essa mundiça, cada um pior do que o outro. Gostei tanto que venho todo sábado”, enfatizou o jornalista, preparando seu violão para cantar outra balada.

Segundo o presidente Geraldo Maia, a confraria é recente e suas metas ainda estão sendo definidas, mas já está sendo montada uma extensa agenda cultural para esse ano. No final de janeiro, a Confraria do Sêbado fez uma grande movimentação carnavalesca. “Preparamos uma prévia de carnaval com muito frevo no pé. Fizemos um carnaval autêntico, com marchinhas, valsinhas e chorinhos, recordando o carnaval do passado”, disse o presidente.

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi tudo bem? quero so comprimentar Geraldo Maia, pois tive o privilegio de conece-lo quando ainda era estudante do curso de Histótia, em algumas viagens q fizemos juntos, eu aluna de Lemuel, juntamente com grupos de alunos, professores e pesquisadores, fizemos várias viagens, para estudo de campo.
Uma abraço Iatamira