18 de julho de 2008

Entrevista com Crispiniano Neto

Fotos: Hugo Macedo Por Alexandro Gurgel

Como foram suas primeiras letras em Santo Antônio do Salto da Onça?
Eu estudei no Grupo Escolar Manoel Dantas. Naquela época, ninguém sabia quem era o Manoel Dantas. É preciso divulgar mais a obra desse grande intelectual. A primeira professora foi dona Altair, que era professora da escola pública. A outra professora era dona Lourdes Barba, que tinha uma escola na minha rua onde estudei alguns anos no tempo em que “argumento” era o nome de uma palmatória. A professora Lourdes fazia meia dúzia de perguntas e se você não soubesse, levada uns bolos de palmatória feita de tábua de aroeira, que os meninos saíam com a mão vermelha. Raramente, eu levava esses bolos. Essa era a pedagogia da época. Meu pai era um agricultor que vinha de uma família de paraibanos. Meu avô era de Bananeiras e minha avó era de Solânia. Meu pai trabalhava basicamente com duas culturas: fumo e mandioca. Quando ele juntava o povo para fazer a farinhada ou ajeitar as folhas de tabaco para fazer os rolos de fumo, ele me botava para ler cordel. Isso desenvolveu minha desenvoltura para a leitura.

Então, foi nessa época que você foi inspirado a fazer Literatura de Cordel?
No interior, o folheto de Cordel é também conhecido como professor porque as pessoas acabam se soltando com a leitura. E isso tudo ficou na minha consciência. Algum tempo depois, eu vim estudar no Colégio Agrícola de Jundiaí. Um dia, o professor Ivo, que era cunhado de Woden Madruga, fez alguns versos comigo, me chamando de irreverente porque eu tinha feitos algumas presepadas por lá. Eu também respondi em versos. A partir de então, eu comecei a fazer poesias e pesquisar um poeta da minha cidade chamado Nestor Marinho. Quero deixar claro que não é o Nestor Marinho de Nova Cruz, pai do deputado federal Djalma Marinho. Estou falando do poeta e violeiro Nestor Marinho, que adoeceu de asma e deixou de cantar. Mas, ele continuou fazendo versos maravilhosos.

De que maneira sua poética foi conduzida para a cantoria de viola?
Quando eu cheguei à Mossoró, eu já trazia todo essa bagagem e me entrosei com os cantadores de viola no Bar Tamandaré, que era localizado por trás do Mercado Público, um reduto de violeiros. Toda manhã, eles se reuniam para bater papo, falar da via alheia, recitar versos e criticar uns aos outros. Ali era onde se encontrava os apologistas, aquelas pessoas que promovem as cantorias. A maioria vinha do interior como Luis Campos, Elizeu Ventania, Chico Pedra, João Liberalino, Manoel Calisto e tantos outros, que iam ao Bar Tamandaré para marcar as cantorias do final de semana e também pegar os pedidos de mote, glosa e poemas que as pessoas faziam para eles cantarem nos programas das rádios Rural e Difusora. Então, eu me entrosei com eles e comecei a escrever meus poemas. Junto com Aldivan Honorato, criamos a Casa do Cantador do Oeste Potiguar, que funcionava onde hoje é a Arte da Terra, as margens do Rio Mossoró. Eu fui um dos diretores da Casa. Ali, eu comecei a escrever. Com a convivência com os cantadores, eu percebi que podia cantar também. Nunca cantei profissionalmente.

Mas, você já teve sua fase de cantar viola e declamar versos por dinheiro?
É verdade. Por causa de perseguições políticas, onde me tiraram meu emprego, fiquei cantando para os turistas no Hotel Thermas, em Mossoró durante um ano. Durante esse tempo, eu sustentei minha família no braço da viola, como se diz no jargão dos violeiros.

Certa vez você declarou que Literatura de Cordel inexiste nos tempos atuais, existiria sim, uma “Literatura de Mala”. Você mudou de opinião ou ainda está valendo sua declaração?
Nos últimos cinco ou seis anos, a Literatura de Cordel passou por uma mudança muito significativa. Houve uma retomada ao Cordel, aparecendo uma nova geração de editores. Havia uma produção de Cordel muito grande com João Martins de Ataíde, Leandro Gomes de Barros, Manoel Caboco e Silva, além de outras 40 editoras fazendo Literatura de Cordel pelo Nordeste. Mas, o papel ficou vinculado ao dólar, se tornado inviável a produção da Literatura de Cordel pelo preço barato que se cobrava nos livretos. Então, surgiu a geração de Gustavo Luz, da editora Queima Bucha, um nome nacional na área, que nos últimos cinco anos publicou mais de 150 títulos de Literatura de Cordel. Depois, surgiu a editora Coqueiro, em Pernambuco, através de um rapaz chamado Igor; Arievaldo Viana e Cledson Viana, em Fortaleza, com a editora Tupinanquim; em São Paulo, o Marcos Aurélio, da Louzeiro; no Rio de Janeiro, Gonçalo Ferreira, da Academia Brasileira de Literatura de Cordel; e a Fundação José Augusto, em Natal, fazendo a coleção “Chico Traíra”, ajudaram a revitalizar a Literatura de Cordel. O que está precisando ser feito é criar uma rede de vendedores para que esses cordéis possam ser distribuídos. Acredito que daqui a dois meses, já estará criada a Cooperativa Brasileira de Literatura de Cordel para viabilizar essa rede cordelista.

Como funcionará a Cooperativa Brasileira de Literatura de Cordel?
A Cooperativa terá sede em Natal, mas ela terá como sócios todos esses editores que citei, além do Piauí, da Bahia, de Sergipe, etc... A idéia e formar uma rede com mais de 200 representantes pelo país inteiro, começando pelo Nordeste. Na hora em que for lançado um folheto em Mossoró, a Cooperativa receber mil exemplares e distribuir nessa rede. Aquele que não venderem os cordéis, devolvem o material com três meses, como faz as bancas de revistas. Nós temos que encarar a Literatura de Cordel como um grande negócio que gera emprego e faz cultura. O Nordeste tem mais de oito mil poetas populares espalhado na Região. Dentre esses, há os que vivem da poesia e os que têm outros negócios. Mas, acredito que 300 a 500 poetas vivem da Literatura de Cordel e, entre cinco ou seis anos, a gente possa construir uma grande rede de negócios.

Você assumirá uma cadeira na Academia Brasileira de Literatura de Cordel. Inclusive, com as presenças confirmadas do Ministro da Cultura Gilberto Gil e do Presidente Lula. Qual a importância desse título?
Eu acho que é um reconhecimento. Há muita gente fazendo Literatura de Cordel. Inclusive, há muita gente falsificando a Literatura de Cordel. Há aqueles que acham que pegar um papel e colocar versos a esmo, sem as normas técnicas de Literatura de Cordel, sem a poética do Cordel, dobrando uma folha de ofício em quatro partes e dizer que aquilo é Cordel. Quando minha candidatura foi aprovada na Academia Brasileira de Literatura de Cordel, a presidência me deu a missão para criar a Academia de Literatura de Cordel do Rio Grande do Norte, ligada a ABLC. Nessa Academia, só vai entrar quem faz o Cordel verdadeiro.

Qual sua contribuição para a Literatura de Cordel?
O que eu acrescentei de novo no Cordel foi dentro da abordagem e na temática. Aquilo que faz parte do folclore não vira fóssil, pode mudar. Agora, mudar sem se perder, mudar sem falsificar. Ser reconhecido pela ABLC significa que minha literatura continua original.

Você é autor do texto “Auto da Liberdade”, um grande espetáculo teatral que ocorre em Mossoró no dia 30 de setembro. As peças teatrais estão sendo fieis ao texto e qual foi a mudança do texto para os palcos?
Há uma mudança significativa do texto para o palco. Quando eu fiz a peça a pedido de diretor de teatro Amir Haddad, foi sugerido para não usar a estrutura da dramaturgia, dos diálogos, etc. Eles disseram para eu fazer um poema contando os quatro episódios da história mossoroense (o pioneirismo mossoroense de Celina Guimarães, primeira mulher a ter direito ao voto direto no Brasil; a abolição da escravatura, em 30 de setembro de 1983; a resistência ao bando do cangaceiro Lampião; e o motim das mulheres, movimento contra o alistamento de jovens mossoroenses) e deixaria para que ele montasse o que iria para o palco. Nem Amir e nenhum outro diretor que seguiu a frente do espetáculo não falsificaram a mensagem, eles adaptaram. Antes de ser feita qualquer alteração, todos os diretores tiveram a sensibilidade de me chamar para conversar e saber minha opinião.

Numa entrevista à revista Papangu, o sebista e editor Abimael Silva declarou que Mossoró só tem um poeta, que é Antônio Francisco, os outros seriam “enfeites de bolo”. Na pele de um poeta mossoroense, como você avalia essa declaração?
Sem nenhum trauma em relação a minha pessoa. E também como reconhecimento do direito de Abimael em declarar sua opinião. Antes de Abimael ser fã de Antonio Francisco, eu já admirava. Aliás, o primeiro folheto de Antonio Francisco nasceu de um curso que eu ministrei sobre as normas técnicas da Literatura de Cordel. Quando ele me apresentou o primeiro poema, ele disse: “Crispiniano, se você disser que os versos estão bons, eu continuo. Se você disse que não estão bons, eu não faço mais”. E eu disse que aqueles versos estavam no nível de Patativa de Assaré. Antonio foi meu aluno e, tempos depois, começou a fazer Cordel melhor do que eu. Eu respeito o gosto de Abimael. Acredito que ele foi injusto, não comigo, mas com Luis Campos, Chico Pedra, Luis Antonio, José Ribamar, Concriz, Eliseu Ventania, Manoel Calisto, Nestor Bandeira, Onésmo Maia, só para citar alguns poetas mossoroenses.

Hoje, você é engenheiro-agrônomo, bacharel em Direito, jornalista, poeta e dramaturgo e uma história de vida entrelaçada com a cultura no Rio Grande do Norte. Como foi assumir a Fundação José Augusto?
Além dessas qualificações que você colocou, eu tinha sido membro do Conselho Diretor da FJA, que não existe mais, que agora eu vou retomar. Fui também da Comissão da Lei Cascudo durante cinco anos. Fiz o projeto Seis e Meia durante quatro anos em Mossoró. Sempre tive uma afinidade muito grande com a FJA. Por outro lado, fui indicado pelo PT, onde sempre trabalhei com cultura dentro do Partido e participei em todas as lutas pela cultura de Mossoró nos últimos anos, independente de quem era o prefeito ou a prefeita. A minha vinda para FJA tornou-se um processo natural na medida em que a governadora convocou o PT para indicar o presidente da FJA. Algumas pessoas da imprensa tentaram fazer uma guerra entre eu e a professora Isaura Rosado. Mas, não havia essa disputa porque se a indicação para a FJA continuasse com a cota pessoal da governadora, a professora continuaria no cargo.

E qual é o grande desafio que você ainda está enfrentando dentro da FJA? Afinal, qual é a real situação da FJA?
Encontramos uma FJA que cresceu muito, mas foi um crescimento artificial. A substancia não correspondeu ao crescimento. A FJA ficou com uma espécie de elefantíase, aquela doença que cria um inchaço. Foram criadas 45 Casas de Cultura, mas não pensaram na programação. Temos os agentes de cultura com empregos precários e as Casas não têm um quadro definitivo. Os vigias e ASG’s para as Casas são contratos provisórios que a gente teve que suspender porque acabou o prazo e a gente não renovou. Já faz quase um ano que as Casas não têm esse pessoal. A FJA só tinha o Teatro Alberto Maranhão e foram incorporados três novos teatros (teatro de Mossoró, teatro de Caicó e o teatro de Cultura Popular) e não há uma estrutura para corresponder a isso. Nós temos uma orquestra sinfônica que já morreram músicos, já saíram músicos e a gente não tem condições para fazer um novo concurso. O concurso está autorizado, mas nós não podemos fazer por causa da Lei de Responsabilidade Fiscal que está no limite prudencial que o Estado atingiu. O concurso para o Coral Canto do Povo foi feito, dois anos se passaram, mas não foi possível contratar e prorrogamos para poder contratar. Então, a estrutura cresceu e não há suporte.

E quais são os planos para sair dessa elefantíase?
No ano passado, nós tivemos que dar um mergulho para fazer um salto pra dentro. Esse ano, a gente começa a saltar pra fora. Eu tenho dito que o ano passado foi péssimo e este ano ainda será um ano ruim, mesmo tendo melhorado muito com tudo que a gente está conseguindo fazer como os 53 Pontos de Cultura; um milhão de reais em editais; 30 cineclubes; Festival Nacional de Hap Repente; a retomadas da revista Preá; a recuperação das Casas de Cultura e uma programação para todas as Casas. Agora, se esse ano for ruim, eu tenho certeza que 2009 vai ser bom e 2010 vai ser ótimo.

Você tem sua história cultural ligada a cidade de Mossoró, onde você militava no PT e era atuante na área cultural. Por essa razão, muitos mossoroenses ficaram entusiasmados com a escolha do seu nome para a FJA. Qual foi a participação da FJA nos projetos culturais em Mossoró e Região Oeste?
Em Mossoró, nós temos vários projetos apoiado pela FJA como o Canto Potiguar, Feira do Livro, Circo da Luz que não é de Mossoró, mas esteve por lá, projeto Aonde o Povo Está, o Oratório de Santa Luzia, entre outros projetos. Mas, tem algumas coisas que estamos devendo à Mossoró como a volta do Projeto Seis e Meia. Eestamos lutando por isso e eu só anuncio quando eu tiver a absoluta certeza que vai dá certo e vamos ter dinheiro para bancar o projeto. A outra coisa é uma reforma no Teatro Lauro Monte que custará, no mínimo, R$ 300 mil e temos quer ter paciência. O Teatro está numa situação deplorável com o desgaste natural do tempo. Espero que esse ano, a gente consiga salvá-lo.

Apesar de serem as maiores cidades do RN, Natal e Mossoró ainda não foram agraciadas com Casas de Cultura. Qual a perspectiva para que essas duas cidades tenham suas Casas de Cultura?
A Casa de Cultura foi um projeto concebido na administração François Silvestre para atender as cidades que não têm um auditório para teatro, que não tem um museu, uma pinacoteca e ou uma boa biblioteca. Então, o projeto vai contemplar o que está faltando. A Casa de Cultura tem auditório, biblioteca, uma galeria de arte, um museu, além de alguns boxes para a venda de artesanato e produtos culturais, além de um espaço aberto para grandes eventos. Uma cidade como Mossoró que já tem seus teatros, seus museus, galerias e bibliotecas, não é necessário criar uma Casa de Cultura. Nós temos é que estruturar esses equipamentos já existentes. Agora, dentro do Programa Mais Cultura, lançado pelo ministro Gilberto Gil em Natal, vai existir um “Centro Multiuso de Cultura”, que foi inspirado nas Casas de Cultura do Rio Grande do Norte.

Como vão funcionar esses Centros Multiuso de Cultura?
Esse é um projeto de R$ 3 milhões que será implantado nas regiões mais pobres e com indicadores sociais mais negativos, principalmente em lugares com maiores índices de violência. O Governo Federal, em sintonia com o Governo Estadual e o Governo Municipal, vai implantar esses Centros Multiuso de Cultura. Nessa primeira leva de recursos através do PAC da cultura (leia-se o programa Mais Cultura), já foi definida uma unidade para Natal. Mas, nós vamos lugar por outra unidade em Mossoró. Em Natal, o Centro Multiuso será instalado numa comunidade carente na Zona Norte, provavelmente o bairro Nossa Senhora da Apresentação, que tem esses indicadores sociais.

O ministro da Cultua Gilberto Gil veio à Natal para assinar convênio na ordem de R$ 4,7 bilhões de Reais para a construção de 53 novos Pontos de Cultura no Estado. Como serão administrados esses recursos?
4,7 bilhões é o volume total de recursos para a Cultura brasileira nos próximos três anos. Dentro desse montante, vai caber ao Rio Grande do Norte uma verba de acordo com os projetos apresentados. Por exemplo: vamos ter uns R$ 7 milhões para os Pontos de Cultura, R$ 3 milhões para o Centro Multiuso, além do dinheiro para a modernização de museus e bibliotecas. E assim por diante

A revista Papangu, que tem publicado uma edição todo mês durante os últimos 4 anos e meio, pode ser transformada em Ponto de Cultura e se candidatar para obter uma verba do Programa Mais Cultura?
Ponto de Cultura é um espaço cultural que já existe, tem CNPJ há dois anos e tem uma ação cultural desenvolvida. Não se inventa Ponto de Cultura. Então, a Papangu tem mais de dois anos e durante esse tempo tem feito cultura. Teria que ser feito um trabalho para levar a revistas às escolas, às comunidades pobres para que o pessoal possa discutir seus artigos, de maneira que levassem os jovens a participar do projeto fantástico que é a revista Papangu. É preciso que haja um trabalho com um raio de ação maior e que haja uma conseqüência cultural e social. E não simplesmente fazer a revista e distribuir.

Ano passado, você declarou que seria construído o “Teatro de Natal” com capacidade para duas mil pessoas e outro teatro na Zona Norte, através do Governo do Estado. Como anda os projetos desses dois novos teatros para Natal?
O Complexo Cultural da Zona Norte, onde foi a Penitenciária João Chaves, é um projeto de mais de R$ 5 milhões e já se encontra com mais de 40% de área construída. Eu acredito que até o final do ano será inaugurada. Quanto ao Teatro de Natal é um projeto muito caro, um montante de R$ 30 milhões e a governadora Wilma está buscando parcerias para que se faça um teatro a altura da demanda de Natal, com 2300 lugares. Se houver um show de Caetano Veloso, ou outro grande nome da MPB em Natal, no Teatro Alberto Maranhão, para 600 lugares, o preço do ingresso vai para vai para R$ 200 ou mais ou quem trouxe vai ter um prejuízo grande. Com 2300 lugares pode ser cobrado um preço razoável, tirar as despesas e ainda ganhar dinheiro.

No início da sua gestão, você tinha a idéia de interiorizar a cultura. Até que ponto a FJA conseguiu fomentar a cultura pelo sertão?
O termo “interiorizar a cultura” está dentro do Regimento Interno da FJA. Porém, nós sentimos que era um termo inadequado. Se alguém quiser interiorizar a indústria, vai implantar um pólo industrial em Venha Ver, Santo Antônio do Salto da Onça ou Carnaubais. Outros segmentos são passíveis de interiorização. Porém, o termo “interiorizar a cultura” causa uma sensação que o interior não tem cultura, que a cultura está na capital e a cidade grande vai civilizar o interior. Essa é uma visão estúpida que parece aquela idéia “euro-centrista” da época do Renascimento, onde se pensava que só a Europa era civilizada e queriam civilizar o mundo da maneira deles. Imagine a estupidez! A China com seus milênios de cultura, o Egito, o Japão, etc...

Então qual o termo certo?
Hoje, a FJA trabalha com a idéia de “intercambiar” culturas. Na hora que você tem uma filarmônica de Cruzeta, lá no Seridó; Dona Militana, em São Gonçalo do Amarante; Gilvan Lopes, em Açu; Antonio Francisco, em Mossoró; Xexéu, lá no sítio Lajes, em Santo Antonio do Salto da Onça; os Caboclos de Major Sales ou a banda de Parelhas, é preciso intercambiar essas manifestações, levando os grupos para as outras regiões. Falar em interiorizar a cultura é uma agressão! Natal precisa receber esses grupos porque eles têm muito a ensinar aos artistas e aos intelectuais da capital.

Em agosto do ano passado, a Fundação deixou de fazer uma homenagem ao mamulengueiro Chico Daniel durante a Semana do Folclore. O que houve naquela época que inviabilizou a justa homenagem ao bonequeiro?
Não houve nada disso. Eu diria que houve uma ação de alguém desleal que gosta de “botar boneco” sem ser bonequeiro. Alguém que estava na FJA mais para atrapalhar, apesar de ter uma obrigação de ajudar. O que houve foi o seguinte: O filho de Chico Daniel, Josivan, nos pediu um apoio, que foi dado, para fazer um vídeo sobre Chico Daniel. Ele lançaria durante a Semana de Cultura, que normalmente acontecia no período do Dia do Folclore, 22 de agosto. Ocorre que no ano passado, nós conseguimos uma verba, através do Ministério da Cultura, para fazer a Semana de Cultura e devido às dificuldades da FJA porque não tínhamos as Certidões Negativas. É bom falar a verdade. Então, o dinheiro não chegou e todas as despesas geradas naquela semana e que nós não tínhamos a datação orçamentária disponível, nós teríamos que pagar através de indenização. Como nós já tínhamos mais de 1200 processos para pagar por indenização, nós tivemos o cuidado de suspender a Semana e fazer o Dia do Folclore com o dinheiro que tínhamos em caixa. Só faríamos as outras atividades quando o dinheiro do Ministério chegasse. Por isso, fizemos em novembro a Semana de Cultura Popular. Nunca houve discriminação com ninguém. Tempos depois, o filho de Chico Daniel deu um depoimento dizendo que tinha sido usado.

No início da sua gestão, você tinha a idéia de criar vários pólos, atendendo cada seguimento cultural. Como está funcionando os pólos de cinema, dança, literatura, teatro, música, etc?
Alguns pólos estão bem adiantados, outros menos. Tudo depende do ritmo dos artistas e intelectuais dos setores. A Câmara Setorial não é da FJA, ela está na FJA. Nós convidamos a sociedade civil organizada que faz a cultura para vir aqui e dizer como quer fazer. O pessoal da música tem avançado bastante. Nós lançaremos um edital de R$ 200 mil, prêmio Núbia Lafayette, fruto desse pólo de cinema. O pessoal dos quadrinhos fez uma proposta de edital para o prêmio Moacy Cirne e vamos fazer.

De que maneira a FJA está planejando fomentar a cultura seridoense?
Já temos a confirmação da governadora que vamos transformar o Castelo do Engady, em Caicó, num Centro de Formação de Artistas do Seridó, dando condições de funcionamento para as mais diversas manifestações artísticas seridoenses.

Há grandes projetos que são beneficiados com a Lei Câmara Cascudo acima de R$ 500 mil Reais e há dezenas de projetos com valores abaixo de R$ 50 mil que não conseguem decolar. Como a FJA está gerenciando essa situação?
A gente tem que cumprir a Lei. Nós estamos num processo de mudança da Lei e eu acho que deve ter um limite. A Paraíba tem o Fundo de Cultura Augusto dos Anjos, que uma vez aprovado o projeto o dinheiro é garantido. As empresas depositam a isenção fiscal no fundo de cultura e não para fulano ou para beltrano. Enquanto a Paraíba tem um Fundo de Cultura no valor de R$ 1 milhão e 300 mil, financiando uns 60 ou 70 projetos de boa qualidade, nós temos uma Lei com orçamento previsto em R$ 5 milhões por ano que financia uns 20 projetos. Em nove anos, a Lei Câmara Cascudo só conseguiu financiar 140 projetos, num montante de R$ 40 milhões. Só no Governo Wilma, foram investidos R$ 27 milhões. Estamos mostrando a governadora que essa forma está errada porque há uma concentração muito grande de dinheiro nas mãos dos poucos, mesmo bem intencionados, que tem acesso aos gabinetes dos grandes empresários.

O deputado Cláudio Porpino tem um projeto de lei criando um Fundo de Cultura para gerenciar os recursos dos Incentivos Fiscais da Lei Cascudo. O que o senhor pensa sobre essa iniciativa?
Acho que é o grande caminho. Mas, precisa preservar a Lei Cascudo. Temos que domar a lei do mecenato para evitar que alguns recebam R$ 500 mil e outros não consigam R$ 20 mil. Com a Lei Cascudo, o Fundo de Cultura e os Pontos de Cultura, nós vamos ter três linhas de financiamento para projetos culturais no Estado e vamos atender um espectro infinitamente maior e mais democrático.

E o futuro do poeta Crispiniano Neto? Há alguma coisa no prelo para publicação?
Eu estou me dedicando a FJA. Sou hipertenso, obeso e tenho histórico de diabetes na família. Ainda não tenho, mas sou candidato. Eu tento me cuidar, mas meu ritmo de trabalho não tem permitido. Normalmente, quando saio da FJA às 9 ou 10 da noite, ainda trabalho em casa. Dentro de no máximo dois meses, na minha posso na Academia de Literatura de Cordel, eu quero lançar o livro “Lula na Literatura de Cordel”, que estou trabalhando nele. Ainda no prelo, eu tenho “20 anos de poesia de Crispiniano Neto” com 800 a 1000 páginas. Devo terminar em um ano, um livro em que estou trabalhando chamado “Improvisos Decorados”. O título pode parecer estranho, mas é o tipo de improviso que os cantadores fizeram e de tão bons que são os versos o povo decorou. Até hoje, os versos são recitados por ai afora. Há mais de 30 anos, lá em Mossoró, Luis Campos escreveu um poema que é assim: “Cantar sem ganhar dinheiro /é viajar numa pista / num carro velho quebrado /um chofe curto da vista / e um doido gritando em cima/ atole o pé motorista”. E tem outro de João Ferreira, lá de Pernambuco: “saudade é um parafuso / que dentro da rosca cai /que tem que entrar torcendo / porque batendo não vai/ depois que enferruja dentro / nem destorcendo não sai”.

2 comentários:

Anônimo disse...

Muitíssimo importante esta entrevista! Mostra o pensamento e o desejo de construir do homem que está à frente da principal instituição cultural do Estado!
Parabéns, Alex!

joseNunes disse...

Joaquim desde de criança já era admirador da cultura,todo que se
falava ele vira poesia.
Eu fui da Escola Manoel Dantas em
Santo Salto da Onça sempre ele gostava de cordel.
Foi fundador de um jornal que teve o titulo o Salto da Onça onde eu fiz parte,com a ida dele a mossoro nosso jornal fechou, Santo Antonio que e nossa cidade perdeu esta grande figura.
Abraço do amigo Jose Nunes.