4 de abril de 2013

Foto é arte ou documento? Enfim, qual é a da fotografia contemporânea?

João Lobo

Fotógrafo paraibano discute a fotografia contemporânea com exposição, debates e palestras, hoje e amanhã; confira entrevista

Por Sergio Vilar

Uma velha discussão tem voltado à tona no meio das artes visuais, mais precisamente no segmento da fotografia: Foto é arte ou documento? Profissionais renomados têm tomado o rumo mais artístico, com registros norteados pelos efeitos estéticos. Outros se mantêm no trabalho de pesquisa combinado ao apuro visual, sem contar ainda o trabalho diário dos fotojornalistas. Mas o fotodocumentarismo contemporâneo se opõe ao modernista em relação a fatores como plasticidade, tema e métodos de difusão? Afinal, qual é a da fotografia contemporânea?

Para discutir sem esgotar o assunto, o fotógrafo paraibano João Lobo oferece um pacote de duas exposições, dois livros, dois vídeos, uma palestra e um debate sobre o tema. Tudo reunido e aberto ao público na Galeria Conviv’art, no Centro de Convivência da UFRN. A vernissage da exposição Across Lens tem início às 19h desta quinta-feira e permanece aberta à visitação até 26 de abril. Já o debate e a palestra ‘Luz e Movimento na Fotografia Contemporânea” acontecem nesta sexta-feira, no mesmo espaço. O debate será travado com a curadora Bete Gouveia, mediado por Bruna Lobo, às 9h.

A reportagem do NoAr conversou com João Lobo para adiantar algo da temática da palestra, e também com o presidente da Associação Potiguar de Fotografia (Aphoto), Alex Gurgel, para tentar afunilar uma resposta mais concreta acerca da pergunta: e aí, qual é a da fotografia contemporânea?

COM JOÃO LOBO

A respeito da temática da palestra, qual o papel da luz e do movimento no atual modelo de fotografia contemporânea?

Estão interligados. O movimento é muito explorado na arte contemporânea. Então fiz um apanhado histórico desse uso para contar na palestra. E a fotografia, basicamente, é luz. Mas no caso desta mostra, o link principal do conceito é a não-luz; é a sombra; o congelamento.

Com o propósito disso?

Uma das imagens da exposição Across Lens (Foto: João Lobo)
A fotografia tem a característica base que é a apresentação do real. Neste projeto procuro desconstruir essa ideia. Então, há uma narrativa nessa direção. Uma questão já ultrapassada é a fotografia ortodoxa, mais limpinha, com acabamento perfeito. A sombra, os borrões, desconstrói essa imagem, até mesmo na montagem da exposição. E proporcionam outra forma de percepção.

Então, o que está sendo tematizado, exatamente, na exposição?

O conceito do projeto é a desconstrução técnica e a fundamentação filosófica do que está sendo tematizado: o tempo. A fotografia é um recorte do momento, tudo bem. Mas e o que vem antes, o durante e o depois? Como o objeto fotografado tem pouca luz, há um tempo de exposição maior. Para registrar a passagem de um carro de fórmula um, por exemplo, preciso abrir a velocidade ao máximo e conseguir um flash no momento. Sem a luz, eu consigo ressaltar a temporalidade. Então, na mesma imagem um objeto começa em um canto e termina em outro. Quero mostrar o que acontece durante este percurso; quero mostrar temporalidade; mostrar que a foto tem movimento. E este será um dos momentos de reflexão da palestra.

Você consegue essa temporalidade dentro do cotidiano normal das grandes cidades?

Há uma organização dentro da desorganização dos grandes centros urbanos. Durante três anos estive imerso em uma região de forte fluxo de pessoas. Parece desorganizado de fora, mas quando se entende a dinâmica do lugar, se percebe uma organização natural, mesmo sem uma gerência propriamente dita. Então, este é o outro ponto de reflexão da palestra: a técnica. Particularmente eu não respeito o apuro técnico da fotografia, com a denúncia, com o registro; não tenho compromisso algum com isso. Meu compromisso é com a visualidade; com a percepção dessa loucura caótica dos grandes centros; um compromisso com a plasticidade da imagem.

Fotografia é mais arte no momento atual?

Depois da inserção da fotografia na arte, como conceito, a fotografia da arte não é mais fotografia. Ela foi absolvida pelas artes visuais, apesar de já ter essa vertente impregnada nela. Usar a fotografia apenas para registro documental é um desperdício. Nas artes plásticas num há a pintura abstrata? Por que eu também não posso uma fotografia abstrata?

COM ALEX GURGEL

Efeitos estéticos na fotografia se opõem ao fotodocumentarismo?

O trabalho autoral (documental) é uma realidade na vida dos fotógrafos que produzem cultura no campo da fotografia e os elementos estéticos ajudam na composição da foto, sendo usados naturalmente na feitura da foto.

Qual a tendência da fotografia contemporânea?

O uso da luz não tem limites. A quebra de paradigmas na fotografia vem sendo revolucionada desde George Eastman, passando pelo olhar de Cartier Bresson, passando pela fotografia dos brasileiros Boris Kossoy, Gilberto Ferrez, Pedro Vasquez e, mais recentemente, a fotografia de Araquém Alcântara, Thiago Santana, Iatã Canabrava, Miguel Chikaoka, entre outros. A criação do foto-clubismo abriu pontes entre os fotógrafos de todo o País, criando intercâmbio entre a fotografia produzida em todos os cantos, mexendo com a produção individual e deixando marcas na fotografia contemporânea brasileira. A era digital deu um novo gás à fotografia contemporânea por mostrar as diversas possibilidades nos usos da luz misturada à tecnologia.

A fotografia tem se inserido com mais propriedade nas artes visuais. Isso tem colaborado para que tome cada vez mais o sentido de arte?

A fotografia já é arte há muito tempo e só está “incorporada” às artes visuais por falta de políticas públicas para a fotografia. De forma geral (arte ou não), a Fotografia é o segundo produto mais consumido no mundo, só perde para o sexo. É importante que a Fotografia seja vista como um setorial com luz própria e se desvincule das artes visuais, tendo seu próprio orçamento no campo das artes, assim como Cinema, Literatura, Música, Teatro, etc. O Ministério da Cultura, através da ministra Marta Suplicy e o presidente da Funarte, Roberto Grassi, já estão empenhados em dar à Fotografia e suas imensas variedades de linguagem e expressão, o seu devido respeito como uma arte nobre com seu setorial próprio.

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