20 de abril de 2006

ENTREVISTA: Fernando Lucena

Jornalista Alexandro Gurgel entrevistando o vereador Fernando Lucena (PT). Foto: Carlos Alves


O sindicalista Fernando Lucena começou sua carreira política em Natal, durante o ano de 1986, quando ingressou no serviço público, na Prefeitura Municipal do Natal. Preocupado com a situação precária dos trabalhadores dos serviços de limpeza, asseio e conservação, fundou a ASSURB (Associação dos Servidores da Urbana).

Sua vocação política começou a despontar ainda na adolescência, em 1967, durante o movimento estudantil, tendo sido dirigente da União Estudantil Caicoense e do Diretório Central dos Estudantes de Pernambuco, quando cursava Relações Públicas na Escola Superior de Relações Públicas de Pernambuco.

Em meio a grandes lutas em defesa dos trabalhadores, Fernando Lucena teve habilidade política para fortalecer a categoria, dando origem a criação do Sindicato dos Trabalhadores em Limpeza, Asseio e Conservação do Estado do Rio Grande do Norte, onde exercendo o cargo de Presidente, vem comandando a luta que tem garantido grandes conquistas para a categoria.

Fernando Lucena foi militante do Partido Comunista Brasileiro, fundador do Movimento Gregório Bezerra. Atualmente, Fernando Lucena é filiado e dirigente estadual do Partido dos Trabalhadores. É membro da Comissão de Saúde, Educação, Assistência Social e Defesa do Consumidor e do Conselho Municipal de Saneamento Básico.

Com uma expressiva votação de 4.186 votos, Fernando Lucena foi eleito com o primeiro mandato de vereador natalense nas últimas eleições. Com um comportamento inquieto e posições políticas polêmicas, o vereador Fernando Mineiro promete ser a voz da classe trabalhadora e das camadas mais populares.

Vereador, o senhor vem fazendo severas críticas ao senador Fernando Bezerra, dizendo que ele não era um bom líder do governo Lula no Senado. Até que ponto o senador Fernando Bezerra atrapalha a reeleição de Lula?
É um homem que passou oitos anos como senador e mostrou que não tem coerência ideológica, pois participou de dois governos. Ele é uma contradição. Foi ministro da Integração Nacional e agora, faz parte da bancada do governo Lula. O Antônio Carlos Magalhães, que eu acho uma desgraça, quando era líder do governo, conseguiu para a Bahia o Pólo Petroquímico de Camaçari, a fábrica da Ford, entre outros benefícios. O que o Fernando Bezerro trouxe para o nosso Estado? Nem uma fábrica de carro de mão. É um senador que não disse para que veio. Agora, só porque é líder do governo Lula, eu tenho obrigação de apoiá-lo? Não há menor possibilidade de isso acontecer. Eu não tenho nenhuma identidade política ou ideológica com esse cidadão. Eu só voto em que eu acho que, pelo menos, está próximo daquilo que eu penso.

Como o senhor avalia o comportamento do prefeito Carlos Eduardo em relação a bancada governista na Câmara Municipal.
Olha, é muito complicado. Qualquer vereador da bancada do prefeito que queira uma audiência com ele, não consegue para menos de 60 dias. Ora, para você ser governo - votando aquilo que o prefeito quer -, você precisa ter algumas vantagens sobre os demais vereadores. E a reclamação que vejo da bancada governista é que o prefeito não atende e maltrata os vereadores. E o que é pior, ele não respeita a Câmara Municipal. Aí é onde eu entro. Eu acho que o prefeito deveria ter um bom relacionamento com a Câmara porque é uma instituição de um poder independente e autônomo. Sou um vereador eleito pelo povo e não tenho satisfação a dar a prefeito. E ainda há o voto secreto que querem acabar. É preciso esclarecer que o voto secreto é um avanço em benefício da sociedade. É preciso esclarecer que o voto secreto é bom para umas coisas e ruim para outras. Nessa questão de derrubada de vetos do prefeito, o voto secreto é bom. Os poderes políticos e econômicos do prefeito não influírem nas decisões secretas dos vereadores da própria bancada governista.

Com os vetos dos vereadores aos projetos do prefeito, de vez em quanto, ocorrem algumas retaliações por parte da prefeitura, ameaçando que vai cortar cargos. Como o senhor ver a postura do prefeito Carlos Eduardo?
É uma grande contradição. Acho que as pessoas que apóiam o prefeito devem ter identidade política com Carlos Eduardo. Eu era da bancada do prefeito e meu partido ainda faz parte da bancada, mas agora, eu sou oposição. Quando eu era da bancada do prefeito, eu não via nada de positivo. O prefeito passou o primeiro ano querendo “arrumar a casa”. Ô casa demorada pra ser arrumada! (risos). Já estamos em quase em abril do segundo ano e a coisa está de mal a pior.

Então, o senhor está dizendo que não tem cargos na Prefeitura?
Não tenho e não quero. Acho que Carlos Eduardo tem que dá os cargos aos vereadores que o apóiam. Mas, deveria ser de uma forma transparente. Eu vejo alguns vereadores da bancada governista falando mal do prefeito. Um dia, eu abordei um vereador e disse: “rapaz, você metendo o pau no prefeito e está aí na bancada. Como é que fica isso?” Eu quando era governo tinha que defender porque sou um cara coerente.

Num raciocínio hipotético, há um grupo de vereadores que defende os interesses dos empresários dos transportes urbanos e que formam a chamada “bancada do Seturn”. Como o senhor absorve a atuação desta bancada contra a grande população usuária de transportes coletivos?
Eu quero começar dizendo que o sistema de transportes urbano de Natal é um dos piores do Brasil e um dos mais caros do país. Há uma conivência muito esquisita na Câmara Municipal. E vou além da CMN, vou ao Poder Judiciário. Acho que é preciso que a sociedade natalense acorde! Para você ter uma idéia, lá na periferia, as linhas de ônibus quando não dão lucro, as empresas mandam tirar. Quando entra um alternativo na linha, “eles” botam na justiça e conseguem uma liminar, suspendendo o serviço e o povo fica andando a pé. Há dois anos existe uma liminar de um juiz proibindo as licitações. Isso é uma interferência na prerrogativa do prefeito, na prerrogativa do Poder Legislativo. Essa atitude é uma interferência do Poder Judiciário de maneira nociva a sociedade natalense. Além de você ter essa relação com os vereadores defendendo os empresários, o cidadão não pode contar com a Justiça. O sindicato patronal não poderia controlar um serviço que deveria ser feito pelo Poder Público. O controle dos tiketes estudantis e o vale transporte para o trabalhador nas mãos do Seturn é um absurdo. O cidadão paga adiantado e é desrespeitado por lá com filas quilométricas e mau atendimento. E ninguém faz nada! Quem perde é o povo que paga caro por um serviço de péssima qualidade.

As linhas de transportes urbanos são utilizadas pelas empresas sem uma licitação de acordo com as normais jurídicas. Os empresários preferem esperar até 2010 para começar o processo licitatório para o sistema de transportes urbanos. Como o senhor ver essa situação?
Uma liminar é uma coisa urgente enquanto o juiz não julga a ação principal. Mas, o prefeito não recorre de uma liminar para resolver a situação e não toma nenhuma providência. Então, o Poder Judiciário não poderia dar essa liminar favorecendo os empresários. Moralmente não podia. Todo o sistema de transporte de Natal é clandestino, menos os alternativos. Até porque, houve uma lei e uma licitação para o serviço dos transportes alternativos, mas o restante é ilegal. Aquelas empresas que atuavam há 50 anos atrás não existem mais, como a Barros, por exemplo. Então, as empresas que prestavam esse serviço não existem mais. Os empresários trocaram os nomes das empresas para atuar como vemos. E tudo isso com a conivência do Poder Judiciário. Acho que o juiz deveria dar satisfação à sociedade. Afinal, ele é um funcionário público. E tem que justificar porque uma liminar, que é uma coisa urgente, faz dois anos que está parada e ninguém recorre e fica por isso mesmo. Ainda temos que esperar para 2010? Que história é essa? Eu quero saber. Estou indo ao Ministério Público para saber que promiscuidade é essa que existe entre o Poder Judiciário, o Legislativo e o Seturn.

Em relação a Saúde Municipal, a secretária Aparecida França tem tido um desgaste político com a crise entre a secretaria e a classe médica. Qual a postura do vereador Fernando Lucena com a saúde?
Nessa queda de braços entre a secretária e os médicos, eu fiquei com ela. Sou da oposição, mas o que queriam fazer com essa moça era uma picaretagem. A máfia branca em ação. Esses médicos fizeram uma greve e ficaram 70 dias querendo falir o SUS, extorquindo a população. O SUS é uma conquista do povo brasileiro. Nessa questão, eu estou com ela e acho que ela foi corretíssima. Teria que ser mais dura do que foi. Mas, o “cabra” pode dizer que a consulta é baratinha, mas a população sabe quando custa um marca-passo? 18 mil Reais num hospital particular e R$ 54 mil pelo SUS. “Eles” embolsam muito. Qualquer prótese de perna custa R$ 30 ou 40 mil pelo SUS e no particular, o mesmo serviço fica em torno de 5 mil Reais. Há uma defasagem num e um superfaturamento em outro. Portanto, alguns desses médicos já deveriam ter sido presos, como o juiz e o Ministério Público queriam. Pena que não foram para a cadeia! Agora, é uma prerrogativa de o prefeito mantê-la no cargo ou não. É uma opção política que cabe somente ao chefe do executivo.

Enquanto a saúde da capital passou por uma crise, a Secretaria de Saúde do Estado, tendo a frente seu irmão, Rui Pereira, tem feito um trabalho dignos de elogios da governadora e também da imprensa. O senhor tem alguma informação que está havendo um trabalho de base para colocá-lo ao lado da governadora Wilma de Faria na chapa majoritária?
Eu sou irmão do secretário e não fica bem eu sair dizendo que ele é bom, que vem fazendo um bom trabalho (risos). Eu sempre soube, e todos estão vendo, que ele é um cara muito competente. Já foi assessor nacional do Ministro da Saúde, exerceu o cargo de diretor da Fundação Nacional de Saúde, prefeito de Serra Negra do Norte, no Seridó, entre outras funções. Ele tem um currículo muito positivo. Agora, com relação a candidatura, acho que é uma decisão do partido. O PT tem vários nomes e o dele é um dos que corre nesse sentido. Eu não queria opinar porque é meu irmão e não fica bem.

E o nepotismo político. Qual sua visão sobre o assunto?
O único projeto político contra o nepotismo que circula na Câmara é meu. Eu acho uma aberração. Eu digo sempre: “a corrupção tem pai e mãe. A mãe é a terceirização, uma ‘caixinha preta’ onde se gasta o dobro e todos os políticos defende porque eles devem levar alguma vantagem. E o pai é o nepotismo”. Como alguém pode dizer que o meu parente é melhor do que as outras pessoas? Por isso que não quero dar opinião com o secretário de saúde (risos).

O senhor acredita que as ações contra o nepotismo vão atingir o Poder Legislativo e o Executivo?
Vai sim porque a sociedade brasileira está exigindo isso. Não dá mais para o político ficar empregando seus parentes. Quem quiser cargos que vá a luta! Seja candidato, seja eleito e vá atrás do seu espaço público. E não entrando porque é parente de A ou de B. Eu sou radicalmente contra o nepotismo.

Nas colunas de políticas dos nossos jornais surgiram notas dizendo que o senhor é “o vereador que veio do lixo”, como uma forma pejorativa de atacá-lo. Como o senhor absorve essas críticas?
Eu acho muito bom. Venho mesmo do lixo e defendo esse povo. Se tivessem dito que eu vinha das elites, então eu ficaria bravo. Não estou aqui para defender as elites porque vim do lixo com muito orgulho. Identifico-me com aquele povo trabalhador que limpa a sujeira desses que não tem o que falar de mim e de outros corruptos que tem aqui. E com a ajuda dos garis, vamos varrendo a sujeira e limpando os políticos corruptos que temos. Se os caminhões de lixo fossem carregar corruptos, passariam mais de 24 horas trabalhando, transportando esse lixo humano que está em todo lugar.

O senhor acredita que a lama que se abateu no Planalto Central com as denúncias do mensalão e o indiciamento de Delúbio, José Dirceu, Marcos Valério, José Jenoíno, Duda Mendonça, entre outros, pode atrapalhar a reeleição de Lula?
Nada! Essa questão de mensalão todo menino besta sabe que existe. Na hora que você é minoria, então você tem que negociar. Não estou defendendo essa prática - eu fui primeiro do partido a pedir uma CPI. Acho que qualquer prática de corrupção deve ser punida. Eu sou o único político desse Estado que defende o fuzilamento para corruptos. O estuprador, o assaltante ou outro criminoso, comete o crime duas vezes e na terceira a polícia o prende e vai direto pra cadeia. Agora, o corrupto rouba a farda da criança, a merenda das escolas, a aposentadoria e a saúde dos idosos, o transporte da população, etc. Então, “eles” matam muito mais do que os marginais todos juntos. Portanto, essa história toda não vai prejudicar a eleição de Lula porque ele é um homem sério. Essa sombra vai passar. Demora, mas passa. O governo de Fernando Henrique Cardoso foi o mais corrupto dos últimos 50 anos. Agora, tudo foi abafado. O governo Lula deixou três CPI’s funcionando para poder apurar tudo e tem que cortar a própria carne, como o PT cortou. Por isso, que hoje, Lula está com mais de 48% de aprovação popular. Todo mundo sabe que quem está fazendo essa sacanagem com Lula é a grande imprensa como a revista Veja, a Rede Globo e outras. Como dizia o velho Brizola: “Quando a Globo e a Veja está de um lado, é porque não é bom”.

Como o senhor avalia o comportamento do deputado Paulo Davim, que abandonou o PT durante as denúncias do mensalão quando a imagem do partido estava desgastada e migrou para outro partido, tentando garantir sua reeleição?
Ele deu um tiro no pé. Ele só se elegeu com os votos do PT e agora eu quero ver. Ele chegou ao partido de última hora e não foi por coerência porque o deputado Paulo Davim nunca foi petista. Ele sempre foi um oportunista que se elegeu e cuspiu no prato em que comeu. Mas, nós, os petistas verdadeiros, não vamos sair do PT. E ele agora vai ver com quantos paus se faz uma cadeira na eleição, sem os votos do PT. O partido não vai dar mais nenhuma cadeira para ele sentar lá na Assembléia Legislativa. Aconselho que ele volte a ser médico e vá cuidar da vida dele, porque duvido muito difícil que ele seja reeleito.

O senhor tem pretensões de ser candidato a deputado estadual nas próximas eleições?
Sim, sou candidato. Não tenho mais idade de perder oportunidades (risos). Já passei dos 50 anos e quero partir pra luta. Acho que há um vácuo muito grande na Assembléia e quem sabe se não vou ocupar o lugar do deputado Paulo Davim (risos). Minha base é a grande Natal e já estou fazendo campanha, andando por todo canto. Sou candidato e vou ganhar essas eleições porque sou do lado do povão e como existe mais pobre do que ricos, eu tenho grandes chances.

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