9 de novembro de 2006

Auto de São Francisco: o teatro encantado no berço das Lajes Pintadas

Texto e fotos: Alexandro Gurgel

O Auto de São Francisco foi encenado no adro da Capela de São Francisco, em Lajes Pintadas.

Além das festividades religiosas e profanas, uma outra atração para quem participou da festa de São Francisco, em Lajes Pintadas, foi o espetáculo “Auto de São Francisco”, retratando a história do Santo que teve a missão divina de pacificar os povos. Considerado a maior representação teatral a céu aberto da região do Trairí, a peça aconteceu nos dias 4 e 5 de outubro, no adro da Capelinha de São Francisco.
Ao longo do tempo, a vida de São Francisco de Assis já foi contada das mais variadas maneiras por cineastas como Roberto Rosselini, que fez dele um mártir, e Franco Zeffirelli, que o transformou num hippie. Entre o realismo do primeiro e a fantasia do segundo existe um abismo que só a literatura foi capaz de transpor.
Para apresentar o Auto de São Francisco de Lajes Pintadas, o diretor teatral, Cláudio Cavalcante, utilizou elementos cênicos singelos, como deve ser a vida do santo. A ótima interpretação dos atores, aliada a uma coreografia bem elaborada deram ritmo ao espetáculo, prendendo a atenção de um grande público. “Procurei utilizar o próprio Auto de São Francisco para contar a história do Santo, adicionando uma composição mais sertaneja ao espetáculo”, ressaltou o diretor.
Parte da história se passa no interior do Rio Grande do Norte, quando o menino Francisco vem reencontrar seus familiares em Lajes Pintadas, um elo perdido quando sua mãe saiu da cidade grávida para ter a criança em São Miguel do Arcanjo, na Tromba do Elefante. Os fatos são narrados por três ciganas que o menino vestido com roupas franciscanas encontra no caminho. Uma cigana vinda do oriente, outra de Caicó e uma outra do “meio do mundo”, conduzem a trama numa alusão aos Três Reis Magos.
O texto de adaptação para o Auto de São Francisco de Lajes Pintadas foi escrito por Geruza Câmara, que também coordenou o espetáculo, e pelo diretor Cláudio Cavalcante. Conforme o diretor da peça, o Auto de São Francisco lajespintadense foi elaborado para contar a história do Homem-Santo que pregou a paz, a humildade, o trabalho pela pobreza e a preservação da natureza. “Fazemos um recorte do presépio vivo franciscano e também da passagem dos cangaceiros pelo sertão”, disse Cláudio Cavalcante.
Todo o talento dos jovens atores lajespintadenses foi mostrado durante a encenação da peça.
De acordo com Geruza Câmara, o trabalho com o Auto de São Francisco não é limitado às duas noites de espetáculo. Envolve um processo de dois meses e meio de atividades voltadas para as artes cênicas, dança, música, confecção de figurinos, adereços, cenários e produção de texto. “O prefeito Fábio Henrique é consciente da importância da prática pedagógica voltada para a arte e a cultura. Assim, refletimos sobre a religiosidade e a preservação da nossa tradição, embalados nas cores, ritmos e formas do nosso folclore”, frisou Geruza Câmara.
Segundo Fábio Henrique, prefeito de Lajes Pintadas, a importância do Auto de São Francisco é resgatar a cultura popular no município, enquanto cultiva a tradição religiosa em homenagem ao padroeiro. “Flávio Lopes, como um bom mossoroense, idealizou um Auto de São Francisco no ano passado e deu certo. Esse ano, nós ampliamos muito mais o espetáculo com 80% dos custos bancados pela prefeitura”, afirmou o edil. O espetáculo também tem o apoio do Governo do Estado, através da Fundação José Augusto.
A peça, de uma hora e meia de duração, foi apresentada pela segunda vez e conta com a participação de mais de 120 pessoas do próprio município, entre atores, figurantes, bailarinos, coreógrafos e apoiadores técnicos. Com todo o suporte da Prefeitura de Lajes Pintadas, as pessoas envolvidas no Auto de São Francisco também confeccionaram peças de figurino, adereços e cenários. A iluminação e efeitos especiais, elementos importantes na encenação foram comandados por Castelo Casado em perfeita harmonia com a coreografia teatral.
Apesar das mutilações históricas, o diretor Cláudio Cavalcante, em parte justamente por causa delas, conseguiu no final obter um efeito de conjunto de modo a fazer com que o expectador percebesse mais vivamente alguma coisa do que foi o espírito franciscano. A acomodação da vida de São Francisco de Assis para a realidade do sertão potiguar foi o grande desafio da produção do espetáculo, que não precisou criar um estereotipo capucho de mártir ou hippie para emocionar a audiência.

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