19 de novembro de 2006

Escolhas, escolhos.

Por Lívio Oliveira

A vida, de fato, condiciona-se por nossas escolhas. Isso parece o óbvio. Seria, se não fosse a realidade e os enganos que ela nos impõe. De escolhas, algumas decisões se transformam em escolhos, obstáculos, estorvos perigosos. Muitas vezes miramos num alvo ilusório, acreditando que ali está a saída, a solução, a salvação mesma. Só depois, com o desastre iminente, ou já consumado, é que percebemos o quanto fomos e somos equivocados. E o pior: não dá mais para voltar atrás. O que fazer?
Não se preocupe, leitor, pois não está aqui mais um autor de “obras” de auto-ajuda. No máximo, um neo-existencialista, com a cara quebrada diversas vezes. Portanto, não darei conselhos, não darei nada. Apenas, faço uma constatação, d’après Guimarães Rosa: “viver é muito perigoso”.
E, mesmo sendo tais os perigos, tantos, que muitas vezes se nos depara o abismo, insistimos em viver. O que diabos é isso, afinal? Viver? Somente o contrário de morrer? Não acredito. Alguém disse uma vez que preferia morrer tragicamente a viver de tal forma. Parece-me acertada a máxima. Mas, obviamente, é preferível viver sem tragédias. Ou, pelo menos, sem a tragédia total. Ou uma pitada do trágico sobre o cômico, como numa mistura agridoce.
Tocar a vida é uma expressão que me intriga. Tocar. Tocar para a frente. Empurrar, forçar para adiante. Tocar na vida seria uma experiência mais interessante, pois seria, talvez, apalpar aquilo que alguns chamam de felicidade. Puxa! Já são devaneios demais!
O fato é que um amigo de um amigo meu decidiu, dia desses, procurando tocar a – ou na – vida tomar uma decisão radical. Uma escolha verdadeiramente revolucionária: separou-se, largou mulher, filhos e coisa-e-tal (como diria Chico) e, urbano que nem ele, mudou-se para o sertão mais brabo do Ceará. Levou, numa pequena mala, roupas (principalmente as cuecas samba-canção), alguns livros, e, principalmente, cotonetes e pomada de cânfora e menta para sua rinite.
Conseguiu comprar uma fazendinha velha, mas simpática, com a casa principal e uma para o casal de moradores, velhinhos, velhinhos, que ali já estavam havia mais de trinta anos, sem nunca terem feito filhos.
O meu conhecido, então, desembestou-se numa alegria só na vida. Num curral pequeno, duas vaquinhas magras o abasteciam diariamente de leite. Havia, com a pouca água, quase nada de área verde, mas isso não desanimava o novo sertanejo. O caminhão-pipa passaria logo. Enquanto isso, filosofar, pitar um cachimbo rústico (sua nova aquisição) e se banhar no resto que havia do açude. Isso sim, era a realização completa e mais perfeitamente acabada!
Num desses banhos de açude foi que conheceu Madalena. Morena forte, batata grossa, peitos pequenos e duros. A moça tinha ido lavar, incauta, sua roupa branca, logo no açude do felizardo novato da ruralidade.
Parecia uma daquelas cenas dos filmes de Tarzan (de preferência, naquelas cenas em preto-e-branco com o grande John Weissmuler), em que o jacaré vai se aproximando de sua presa. Foi assim que o branquelo, seco de tudo, tantos dias de contenção, conquistou e se apossou de Madalena. Quase na marra! Só não o foi porque Madalena gostou. E como gostou!
Acontece que todo o planejamento para os dias restantes da existência do tresloucado aventureiro foi por açude abaixo, a partir daquele dia. Isso porque, pouco tempo depois do ocorrido, numa nova visita “anfíbia”, Madalena revelou ao homem de destinos loucos e instintos precipitados:
- Cumpade, meu marido num gosto nadinha di sabê du acontecidu, não! Mió a gente criá o nosso mininu na cidade grande!

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