28 de dezembro de 2006

A cultura viva em Santa Cruz do Inharé

Teatro de rua fez parte da IX Jornada Cultural de Santa Cruz

Textos e fotos: Alexandro Gurgel

A Cultura Popular é um magnífico tesouro que enobrece a alma de qualquer pessoa, encantando e emocionando os corações. Ela abrange um elenco de manifestações que faz parte do cotidiano do povo; um relicário de valores expressivos que vão se perpetuando através das gerações, alimentando a memória viva da comunidade envolvida.

Tentando criar uma identidade cultural em Santa Cruz, cidade de médio-porte na região do Traíri, o radialista e poeta Hugo Tavares organizou a “IX jornada Cultural”, com o apoio da Rádio FM Comunitária Santa Rita. Durante uma semana, o evento mobilizou a cidade com Torneio Aberto de Dama, Festival de Cinema, Torneio de Futsal, Oficina Fotográfica, teatro de rua, palestras, shows musicais, apresentação de danças, de repentistas, de violeiros, de poetas, etc.

Sem nenhum apoio da prefeitura municipal de Santa Cruz, que se mostrou inerte enquanto a cidade festejava a cultura, o evento vem se consolidando como uma forte tradição na região do Traíri. A idéia de realizar as jornadas surgiu quando Hugo Tavares morava em Catolé do Rocha e ficava fascinado com a “Semana Universitária” que os estudantes realizavam. “Aquelas imagens e iniciativas, fomentando a cultura de uma cidade tão pobre e tão violenta, marcaram o meu coração e a minha mente”, ressaltou Hugo.

Quando Hugo Tavares era estudante universitário da UFRN, foi presidente do Diretório Acadêmico do Nest-Núcleo de Ensino Superior do Traíri, em Santa Cruz, realizou a primeira “Semana Universitária de Santa Cruz”, em 1986, levando a idéia para outros Campi Avançados do interior. ) “Já realizamos 9 Jornadas Culturais, que na verdade são semanas universitárias da minha infância. Agradeço aos estudantes universitários de Catolé do Rocha, anos 60 e 70, que me permitiram cultivar dentro de mim essa semente que atravessou o tempo e que ainda hoje eclode nas ruas e no sentimento do povo de Santa Cruz”, frisou.

Enquanto as cidades norte-riograndenses procuram recuperar suas manifestações culturais, a prefeitura de Santa Cruz cruza os braços, como se o povo santa-cruzetense não fosse digno de celebrar sua própria cultura. De acordo com Hugo Tavares, foram encaminhados ofícios ao chefe de gabinete da prefeitura, Dinamérico Augusto, solicitando prédios públicos para realização de eventos como o teatro e a Vila de Todos, devidamente protocolados e assinados, mas nenhum deles foi atendido.

Por telefone, a reportagem da Papangu falou com o secretário municipal de Cultura, José Iranilson, que demonstrou não ter conhecimento das inúmeras manifestações culturais que aconteciam em sua cidade, apesar de ser atributo da sua pasta. “O senhor procure o prefeito que ele pode fornecer os devidos esclarecimentos”, aconselhou o secretário de cultura, esquivando-se da responsabilidade.

Os caminhos da cultura

Conforme Hugo Tavares, as jornadas culturais em Santa Cruz têm resgatado, gradativamente, as manifestações lúdicas e culturais da cidade. O artesanato santa-cruzetense é um exemplo desse trabalho, que foi valorizado ao ponto dos artesões serem convidados a se estabelecer na recente inaugurada “Vila de Todos” e que, até o ano passado, fazia parte da Jornada Cultural. “Fiquei muito emocionado no dia em que decidimos não mais fazer a feira de artesanato. Avaliamos que talvez fossemos ser incompreendidos e não queríamos atrapalhar, já que os artesões estavam estabelecidos na Vila de Todos. Mas, Fico feliz porque nosso objetivo foi alcançado e todos sabem”, afirmou.

O “Canto Potiguar” é um espaço dentro da Jornada Cultural que busca valorizar a música local, reunindo cantores, compositores e instrumentistas, abrindo espaço para a divulgação do talento regional. Conforme Hugo Tavares, no início, armava-se palco e toda uma estrutura para as apresentações.

Com o tempo, o projeto “Canto Potiguar” ficou sendo transmitido através da Rádio FM Comunitária Santa Rita, em diferentes locais da cidade. Esse ano, no “Canto Potiguar” se apresentou nomes como Valéria Oliveira, Maestro Camilo Henrique, Quarteto de Trombone Seridó (UFRN), Grupo Som Brasil, as Potiguaras, entre outros.

O Torneio de Damas, com regulamento internacional, reuniu atletas de toda a região e atraiu outros jogadores da vizinha Paraíba. “Através da dama, já recebemos vários chamamentos para a realização de um torneio de Xadrez”, frisou Hugo. Outro momento lúdico da 9ª Jornada Cultural foi a Oficina Fotográfica, despertando a criatividade de jovens e adultos em busca da melhor imagem, culminando com uma exposição na Casa de Cultura “Palácio Inharé”.

A Companhia Teatral Arte Viva apresentou dois espetáculos nas ruas do bairro Maracujá: “O Lixo em Verso e Prosa” e “Loja de Chapéus” para o delírio da audiência. Na zona rural e na periferia da cidade, aconteceram torneios de futebol de campo, onde foram reunidos mais de 20 times, cuja premiação para o campeão era um bode. “Quando vamos entregar a premiação ao capitão do time, damos um jeito para o bode se soltar. É aquela gozação e correria. Já teve caso de ninguém pegar o bode”, frisou Hugo.

Preparando a próxima jornada

No último dia do evento, enquanto o povo santa-cruzetense se esbaldava em alegria na “Noite do pega-rela”, no sítio do Seu Dudu, animado pela Banda Fenômeno Musical e As Potiguaras, Hugo Tavares e a equipe da Rádio FM Comunitária Santa Rita já estavam planejando a 10ª Jornada Cultural para o próximo ano.

Segundo Hugo, o evento transcorreu conforme o planejado. Inclusive, acontecendo vários momentos que não estavam na programação. De acordo com a avaliação dos organizadores, a 9ª Jornada Cultural foi umas das mais importantes entre todas. “Foi muito boa e com certeza nasceram muitos frutos. Afinal, plantamos muitas coisas”, revelou.

Apesar da falta de apoio do Poder Executivo Municipal, a Jornada Cultural de Santa Cruz obteve apoio da Casa de Cultura Popular “Palácio Inharé”, da Câmara de Dirigentes Lojistas de Santa Cruz, Banco do Nordeste, IBGE, UFRN, O Boticário, Lojas Maré Mansa, Oeste Lab, Ótica Oriental, entre outros patrocinadores.

Para Hugo Tavares, a Rádio FM Comunitária é a única voz que tem coragem de enfrentar os últimos imperadores do Trairi. “A prefeitura não vai ajudar quem, de vez em quando, discorda de atitudes e procedimentos do prefeito. Ele sabe que a nossa rádio não é uma Maria-vai-com-as-outras e, sempre que necessário, estamos denunciando as coisas erradas e cobrando o direito do povo”, disse.

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