Por Leonardo Sodré
Tudo começou quando a escritora Clotilde Tavares reclamou publicamente na lista de discussões “Umas & Outras” sobre as incômodas músicas de forró nas proximidades do seu apartamento, em João Pessoa. De pronto o sociólogo e fotógrafo Karl Leite iniciou uma cruzada para que a filha de Campina Grande não voltasse para lá e tampouco ficasse em João Pessoa, mas que voltasse para sua silenciosa casa de Capim Macio, em Natal. O movimento “Volta Clotilde” somente não tomou mais força e se tornou uma referência nacional porque atendendo a apelos paraibanos, ela contemporizou, inclusive usando o argumento da situação geográfica da capital paraibana.
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Mesmo assim, membros do grupo de discussões, elogios e brigas do Beco da Lama, resolveram tentar convencer a escritora usando métodos mais sutis do que os utilizado por Karl Leite. Entre sussurros na penumbra da mesa redonda do Bar Bardalos, resolveram que o melhor caminho seria o da diplomacia via argumentos gastronômicos. Um dos cúmplices passou a provocar um encontro da lista “Umas & Outras”, sutilmente, que deveria acontecer em Natal. Apostava no meio daquela confraria de “retorno”, que uma comidinha regional e bons argumentos trariam Clotilde definitivamente para Natal.
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Provocado pelo grupo, Oswaldo Ribeiro resolveu bancar o prato principal: iria doar um dos bodes da sua criação que mantém as margens do Itans, na terra dos Caicós. Depois disso foi só marcar a data, que coincidia com a véspera de um feriado, e mandar alguém forte para João Pessoa, para fazer companhia a Clô e carregar sua bagagem caso o ônibus quebrasse. Mais um artifício de gentileza para garantir o retorno dela para a capital do Sol.
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Para buscar o bode no Seridó Oswaldo destacou Chagas Lourenço e Eduardo Alexandre (Dunga). E justificou: “Chagas é sertanejo e conhece bem a região. Saberá escolher o melhor dos bodes e Dunga, foi um dos maiores caçadores de calangos das matas do Tirol e sabe encontrar os rastros de um animal no meio da caatinga. Eu não vou porque tenho que ficar moderando o grupo do Beco”.
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Foi tudo sincronizado. Jotó seguiu para João Pessoa para carregar as malas de Clotilde e uns 30 ou 40 livros que ela estava trazendo de presente, outros companheiros foram organizar a área de lazer de Padre Agustín, onde seria realizado o jantar de convencimento e Chagas e Dunga partiram numa picape alugada em direção a fazenda de Oswaldo, nas cercanias de Caicó. A previsão era de que Clotilde chegaria por volta das 18h, tendo tempo para descansar um pouco num hotel cinco estrelas, pago por meio de uma cota, que Alex Gurgel liderou. Chagas e Dunga deveriam chegar um pouco mais cedo, porque haviam partido de madrugada.
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Lá pelas nove da noite tinha tudo na casa do padre Agustín. Menos o bode porque Dunga e Chagas não deram sinal de vida. Era evidente o desconforto de Oswaldo, que disfarçava tirando fotos até de um papagaio que padre Agustín cria desde o tempo em que era seminarista. Clotilde contemporizava: “Calma gente, se tivesse acontecido alguma coisa a gente já estava sabendo. Notícia ruim voa”.
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-Então diga uma noticia boa. Diga que vai voltar para Natal – aproveitou-se Alex Gurgel, um dos cúmplices da mesa redonda do Bardalos.
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-Olhe Alex, depois tanto agrado, é bem capaz... Quem sabe...
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Crys Tinoco emendou:
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-Eu lhe ajudo com a mudança...
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Já passava da meia noite quando escutam um barulho de carro buzinando e alguém declamando uma poesia na porta dos fundos da área de lazer de Agustín, bem no Beco da Lama.
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Cabrito, que tinha resolvido ser o primeiro a esperar o bode – nada mais natural -, abriu a porta. Do lado de fora, Dunga e Chagas, queimados do Sol e de muitas cervejas, de fazer dó, estavam tirando várias galinhas ao molho pardo de dentro da picape. Oswaldo chega sorrateiro e pergunta pelo bode. Dunga responde.
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-Aqueles bodes não aprenderam a amar na infância... Não deixaram a gente chegar nem perto. Era tudo treinado... Aí, resolvemos e buscar umas galinhas lá no “Forrozão”, em João Pessoa, porque um dos membros paraibanos da lista “Umas & Outras” garantiu pelo celular que Clô adorava a comida de lá.
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Taparam a boca de Dunga com fita adesiva e garantiram a Clotilde que os bodes de Oswaldo haviam sido todos roubados. E a festa continuou com as deliciosas penosas do “Forrozão”, embora todos jurassem para Clô, que desconfiou conhecer o tempero das ditas, que elas tinham vindo de Parelhas, de uma granja de engorda de Hugo Macedo, que confirmou todas as mentiras.
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Clotilde Tavares ainda não voltou para Natal.
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