25 de setembro de 2009

Em Macau, Museu José Elviro resiste ao tempo (e ao espaço)

Fotos: AG Sued Fachada do Museu José Elviro

-Várias âncoras antigas em estado avançado de ferrugem em meio as louças pertencentes as famílias da região, dezenas de oratórios, fósseis milenares, ferros de escravos e materiais diversos que o senhor João de Aquino colecionava, estão amontoados num grande galpão, onde abriga o Museu José Elviro, o único museu vivo de Macau, com visitação diária.

Parte da história macauense está entranhada no Museu José Elviro. Entre as raridades que estão expostas é possível destacar a Pia Batismal, em estilo barroco, onde foram batizados a Baronesa de Serra Branca e monsenhor Joaquim Honório da Silva; objetos de arte sacra do século XVII com pintura original; pedestal da Santa Cruz, que o português Manoel Gonçalves chantou em terra brasileira.

Entre as relíquias do museu, há objetos que contam a história do município, como o pelourinho onde os escravos que tentavam fugir eram acorrentados; a ata da primeira sessão da Câmara Municipal de Macau, datada de 18 de outubro de 1947, instalada pelo senhor Jerônimo Pereira de Macedo; além de um grande livro contendo uma coleção com mais de 10 mil selos nacionais e estrangeiros.

Além de moedas e selos do tempo do Brasil Imperial, o Museu José Elviro guarda preciosos documentos da Guerra do Paraguai; mais de 100 objetos pessoais que pertenceram ao monsenhor Honório; e uma cadeira quase intacta do 1º Juiz de Paz de Macau. Tudo isso está catalogado desde 1998, quando a Fundação José Augusto enviou um equipe para fazer o levantamento das peças.

Seu João de Aquino teve o cuidado de guardar um “guia farmacêutico”, de 1856, incluindo tudo sobre a medicina homeopática daquela época, além de muitos objetos usados na Segunda Guerra e outros tantos objetos marítimos. Há relatos que João de Aquino comprava as peças, porém várias pessoas afirmam que outras eram doadas para o museu.

Atualmente, o Museu José Elviro é cuidado por Gilson Barbosa de Lima, funcionária da prefeitura cedido para o museu, desde 1996. Conforme Gilson, o interesse de João de Auino em colecionar objetos de cunho histórico surgiu quando alguém o presenteou com uma antiga imagem de Sant’Ana (a primeira peça do museu), em 1936. “Atualmente, o Museu tem em seu acervo cerca de 6 mil peças”, afirmou Gilson.

Caminhar pelo grande galpão é conhecer a história de Macau e parte da história do Rio Grande do Norte, que há mais de 50 anos o sonho de João de Aquino cultivou e transformou em museu o acervo que juntou e reuniu nessa precária edificação no centro de Macau, sede da antiga Companhia de Navegação, localizado na rua Augusto Severo.

-João de Aquino, um sonhador

De acordo com a jornalista Regina Barros, que conviveu durante muito tempo com o senhor João de Aquino, ele era uma pessoa de uma personalidade muito forte, um homem determinado e perseverante em seus objetivos. A jornalista relata que quando João de Aquino escolheu reunir suas peças para contar a história de Macau, ele ultrapassou todos os obstáculos.

“Um homem simples, muito pobre com uma família numerosa. Mas, o sonho grandiosos de reunir, peça por peça, a história de Macau, ele levou até o final da vida”, disse Regina, ressaltando que ele ainda juntava dinheiro para comprar peças e com o passar do tempo, quando as pessoas perceberam que ele estava colecionando peças antigas, passaram a doar. “Às vezes, ele investia o salário inteiro na aquisição de peças”, assegurou.

Regina Barros garante que muitos documentos importantes foram doados e que algumas peças foram conquistadas na “marra”. A jornalista lamenta que não foi dado ao senhor João de Aquino o apoio que ele necessitava e merecia para alavancar e preservar funcionando o Museu. “Fui uma luta solitária”, explicou a jornalista, salientando que “poucas vezes” ele conseguiu apoio. “Ele nunca teve um compromisso institucional com o museu, nunca teve apoio constante do poder público”, completou.

A jornalista Regina Bastos disse que ficou muito preocupada com o destino do Museu José Elviro depois que o senhor João de Aquino faleceu. Porém, ela se sente aliviada porque o Museu está entregue nas mãos de Gilson, uma pessoa que o sonhador João de Aquino encontrou em vida, que o assessorava. “Além do trabalho feito por Gilson, a família de João de Aquino também ajuda na preservação”, assegurou.
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Ex-gari cuida do Museu

Gilson Barbosa toma conta do Museu desde 1996.

Em Macau, somente é possível visitar o Museu José Elviro (manhã ou tarde) porque existe alguém que foi escolhido pelo próprio João de Aquino para cuidar do museu. Gilson Barbosa é funcionário da Prefeitura de Macau, onde exercia a função de gari, sendo cedido oficialmente desde 1996, pelo poder publico municipal para zelar pelo museu.

Com seu esforço e dedicação ao museu e seu acervo, Gilson tornou-se o coordenador do museu. Atualmente, ele desenvolve a atividade de museólogo e ainda encontra tempo para estudar o curso de Educação Física pela UFRN. Graças ao Museu Câmara Cascudo (Natal), ele pode fazer, em 1997 o curso de museologia, através da pró-reitoria de extensão da UFRN. Tudo isso fez de Gilson um apaixonado por museu.

Quando perguntado quais as peças mais importantes do Museu, Gilson Barbosa lembrava a mesma resposta dada pelo João de Aquino: “Todas as peças são importantes. Não há nenhuma peça com menos ou mais valor de importância”. Gilson relata que cada peça tem seu fragmento histórico, um relato de vida ou uma história pra contar.

Gilson Barbosa afirma que há 5208 peças catalogadas e que precisam ser tombadas por uma nova catalogação porque na época em que foi feita o registro das peças (há mais de 10 anos), não havia a tecnologia que tem hoje. Conforme o zelador, muita coisa não tem mais identificação e o padrão da linguagem museau não está sendo atendida. “Essas peças merecem ser mais bem preservadas. A solução para o resgate e preservação das peças é o cuidado constante”, completou.

Gilson relata que entre 2000 e 2004, o Museu José Elviro ficou fechado porque a estrutura física não oferecia segurança para as pessoas e muito menos para o acervo histórico. Ele assegura que houve uma queda no fluxo de turista que visita o Museu, mas garantiu que ainda visitado por alunos, professores, estudiosos, numa média de 100 pessoas por mês. “Com o falecimento de João de Aquino, caiu muito o número de visitantes”, disse.

Um comentário:

Paulo disse...

Com essa matéria fica provado que o brasileiro não garda a sua história. É uma pena.