11 de setembro de 2006

Encastelados

Foto: Karl Leite
Da esquerda para a direita: Plínio Sanderson, Isaura Rosado, Eduardo Alexandre (Dunga) e Laélio Ferreira. Ao fundo, o Castelo do Engady, em Caicó.

Por Plínio Santos

Bardallos, sexta-feira, Dunga convida para a missão de tomar posse do Castelo de Engandy, em Caicó, no dia seguinte. Interessante a idéia da viagem pendular ao Seridó, principalmente se no programa a volta é via as paragens do Gargalheiras, para comemorar o natalício do amigo Huguito e conhecer sua encantada Pasárgada, em Acari.

Entretanto, quem diz que o poeta tem alforria para embarcar na tarefa nada árdua. Depois de curtições da galera (Orf, Serrão, Sandrinha e Zécarlos), a estratégia foi Dunga ligar para patroa e argumentar um habeas-corpus preventivo ao manicaca juramentado. Saiu pela culatra. Telefonema atrevida da madame (que me doma). Resoluto, enfrento a fera em meio à hecatombe. Que se dane, ô bicho macho!

Sábado, 4.30, despertador anuncia as providências... Cinco e quarenta e cinco, o Santana chega com Karl, Dunga e piloto Érico. Dez para seis, Orf liga querendo saber se tinha lugar. Como o mesmo ainda não havia feito sua higiene pessoal, declinou; e seguimos, o cheiro do orvalho no ar, e o sol nasce (renasce, morre, remorre) despertando as chalanas...

Em Tangará, café na parada tradicional. Encontramos o staff do Cláudio Porpino (dep. da cultura, êpa!). Em campana, podemos fazer uma leitura da conjuntura política a partir da presença dos carros na estrada ou dos cartazes afixados nas casas e cidades. Sem dúvida, no Seridó, ficou nítida a presença do candidato João Maia.

Entrando em Caicó, e a profª Isaura liga, dizendo que nos espera no castelo. Barrados no castelo. Encastelados. Sem contatos prévios, Dunga ainda precisa entender o funcionamento da estrutura, a única informação era de Marcotoni, que afirmou ter uma família morando nas dependências do Engandy. Então, cadê as chaves, não havia nenhuma família morando lá, o Padre, tinha sido visto numa van, só Deus sabe pra onde embarcara. Os funcionários da FJA de Caicó, também não sabiam de nada. Incrível como ninguém sabe de nada neste, país, neste estado, naquela cidade, eis o problema do Brasil, falta de conhecimento.

Imaginem o propósito inusitado de construir um castelo no meio do semi-árido nordestino. A idéia foi do padre Antenor, edificar sob afloramentos cristalinos um castelo de estilo eclético. O Castelo de Engandy, “a erva do deserto”. È uma visão surreal, tal qual a cena inicial do filme “Cabeças Cortadas”, do cineasta Glauber Rocha. Num Castelo medieval, na península Ibérica, um rei delirante, atende dezenas de telefones, como se estivesse negociando numa bolsa de valores.

O estado do castelo é de abandono. Práxis, demência, útero: transformá-lo num espaço de ambiência cultural. Instalando em suas tortuosas dependências um acervo que aglutine víveres e saberes da cultura seridoense. Salas temáticas: ciclos do algodão e do couro; artefatos minerais, pequena biblioteca, mostra de artes plásticas, fotos memoriais da cidade e/ou região, implantação de cursos arte-profissionalizante, oficinas de iniciação à música, ao teatro, artesanato; enfim, tornando o castelo num amálgama da produção cultural da região, realizando interface entre a cultura e turismo, pensando sempre na sustentabilidade do lugar e na geração de renda. Claro que o espaço deve receber eventos multimídias. Festival de Arte Nordestina? Não sei, acho que deveriam reter-se as manifestações seridoenses, e no grand finale, Chico César, cantando Caicó Arcaico aos peitos catolaícos.

Ficamos sabendo que o motorista teria que voltar no mesmo dia, o que inviabilizaria a tão almejada dormida em Huguito. Tínhamos nos programado para festa e dormi por lá: bebidas, redes (“tipóias de amores clandestinos”) na bagagem. Sem poder nos comunicar com Hugo, só depois ficamos sabendo pelo mesmo que a festa havia ocorrido na noite da sexta, ou seja, sem raspas, nem restos. Ele estava “noivando” com Ana Lia em Cruzeta, combinamos nos encontrar no açude.

Ainda em Caipolera, bebemos cervejas com churrasco à moda caicoense no Galileu e rumamos para Acari. Entortamos outras cervejotas, esperando o Hugo e primeira dama, comemos uns filés de tilápias na Pousada do Gargalheiras. Enquanto Karl tentava descolar dois air bags fenomenais. Chega o casal, acompanhado pela dona do bristô, esposa do Francês. Despedimos-nos lamentando a falta de comunicação, “quem não se comunica se trombica”.

Indo de volta pra casa... Constamos que o Dunga, heroicamente conseguiu sobreviver a quase trezentos km de distância do beco, contrariando a tese que o cordão umbilical entre ele e o Beco agüentaria apenas vinte km de separação. Quanto à rainha do castelo acho que o bobo, dublê de rei, deveria emigrar Gardênia, que cada dia está mais lady. Chegamos a Natalópolis, recebendo a notícia da vitória do mecão em Brasília. Sou da América do Sol, do Sal. No domingo, pedalando a beira do atlântico, protelo a morte e levito sob as águas placentárias do oceano.

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