11 de setembro de 2006

O Cajueiro de Pirangi

Foto: Alex Uchôa
Por Vicente Serejo

Fruto nativo dos tabuleiros e dunas destas terras do Brasil, sempre vizinhas do mar, o caju é tema dos mais antigos e ricos registros históricos dos cronistas e viajantes que ao longo dos séculos descansaram o olhar sobre a paisagem brasileira. É de André de Thevet, em 1558, a mais antiga descrição, comparando o caju a um ovo de pata, inaugurando no olhar curioso do visitante a sensualidade de sua forma e do seu cheiro, entre amarelos e vermelhos flamejantes.
Jean de Léry comparou o caju a um ovo de galinha. José de Anchieta e Pero de Magalhães Gandavo, a 'peros repinaldos'. O grande Gabriel Soares de Souza achou a castanha parecida com um rim de cabrito; Marcgrave viu um rim de ovelha; e Nieuhof, talvez para ser original, um rim de carneiro. O Príncipe Maurício de Nassau protegeu os cajueiros por decreto, proibindo os machados, e fez seu doce, em compotas, chegar às melhores mesas da Holanda.
Padre Simão de Vasconcelos, cronista da Companhia de Jesus, deixou dito: 'O cajueiro é a mais aprazível e graciosa de todas as árvores da América e por ventura de todas da Europa'. Southey, na Terra do Pau Brasil, descreveu o cajueiro como 'A árvore mais útil da América'. Louvado por suas qualidades terapêuticas, caju vem do tupi-guarani 'acayu' ou "aca-iu', e significa ano, tudo porque os índios contavam a idade a cada safra. Foi motivo de uma guerra, inspirou a toponímia, é tema nas artes e no folclore, prato na cozinha e traço na cultura nordestina. Do caju se faz suco, mel, doce, passa e cajuína, uma bebida sem álcool.
Em Parnamirim, município do Rio Grande do Norte, célebre por ter sediado a maior base militar fora dos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial, vive, frutifica e ainda cresce o maior cajueiro do mundo, com mais de cem anos: o Cajueiro de Pirangi. Nos anos oitenta a equipe do Guiness Book veio ao Rio Grande do Norte e constatou: é a maior árvore frutífera do mundo. Sua copa tem oito mil e quatrocentos metros quadrados, produz oitenta mil frutos por safra e equivale a um conjunto de setenta cajueiros adultos ou um campo de futebol.
Um dos seus registros jornalísticos mais antigos é uma matéria histórica da revista O Cruzeiro, edição de 8 de janeiro de 1955, na qual descreve sua forma como se fosse um polvo gigante por suas raízes e galhos tentaculares. Há cinqüenta anos já era visitado por Assis Chateaubriand, Lucas Garcez, Juscelino Kubitschek, Amaral Peixoto e Gilberto Freyre. O sítio desse cajueiro gigante chegou a ser uma propriedade particular do governador Sylvio Pedrosa e há também informações de que foi plantado em 1888, pelo pescador Luís Inácio de Oliveira.
Do alto, é um pequeno bosque, denso e verde. À sua sombra, o visitante descobre que é uma pequena floresta nascida de uma só árvore a estender seus galhos de folhagem viçosa. No verão, se cobre de flores e produz cajus amarelos e sumarentos para celebrar os dias luminosos e maduros de um tempo cheio de vida. Diante de um mar deslumbrante, é um milagre desta terra radiosa que um dia Câmara Cascudo, seu filho mais ilustre, anunciou ser a Noiva do Sol.
Crônica publicada no Jornal de Hoje, em 9 de setembro de 2006.

Um comentário:

Tubarc disse...

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Elson